sexta-feira, 4 de abril de 2008

Carta aberta

CARTA ABERTA

Sobram-me estas palavras, ainda e sempre as palavras, que correm nesta minha dor.

Dava para escrever histórias, crónicas, um livro e mais histórias.

Porque as palavras são as únicas que nunca me falham, que me alimentam os sonhos e me sustentam os dias, quando nada mais me rodeia do que a solidão e uma vaga ideia de espera.

Porém...!

Junto estas palavras, para vos dizer que já passaram alguns meses, desde a primeira noite que dormi na Rua, ainda sinto na alma, a dor, o frio, o panico que então senti nessa noite.

Receoso da fome, da hegiéne, do duro quanto seria o chão, que seria a minha vida dali para a frente...!?

Não fui adolescente, tornei-me homem muito cedo, comecei a trabalhar aos onze anos de idade, lutei sempre com o entusiasmo de quem adora a vida, consegui atingir o lugar para o qual tinha partido, com o objectivo de lá chegar.

As filhas nasceram, cresceram, envelheci...!

Hoje com quase meio século de existência, sou um Sem Abrigo!!!

Numa curva da vida (uma sociedade mal calculada) numa curva sem protecção, eu caí na Rua.

Perdi a auto-estima, perdi a esperança, perdi tudo.

Cometi erros, é verdade!!!

Quem ainda não errou???

Quero vencer, acredito que é possivel!...

A sociedade impede-me de seguir em frente, as portas estão fechadas, as janelas não se abrem, mas continuarei a tentar chegar áquele lugar, de onde vim.

O M.A.S.A. "Movimento de Apoio ao Sem Abrigo" não é a realização de um sonho...

É a necessiadade de fazer sentir á opinião publica, as injustiças sociais, após sentir o que é a Exclusão Social.

É a necessidade de gritar, Basta...! Que se foi formando no meu espírito, com o sofrimento de centenas de Homens, Mulheres e Crianças, a quem a rua levou os sonhos, hoje quase irrealizáveis.

Levou consigo o meu retrato, não daquele que sou, mas daquele que fui... Belo de alma, pai presente, crente, puro em toda a acepção da palavra.

É o sentir a dureza do chão frio, onde todas as noites deito o meu corpo, que lhe dá vida, e torna possivel o seu nascimento.

O M.A.S.A. (Movimento de Apoio ao Sem Abrigo) é como um filho, é pertenca do meu coração, gerado no meu espírito, formado no meu interior, nascendo com a minha dor,é parte de mim, mas que o futuro só a Deus pertence.

Assumo a paternidade, mas preciso de ajuda para criar este «filho», para que juntos possamos tirar algumas pessoas da Rua.

Quero que entendam, de todo o coração, eu dedicarei a minha alma a esta causa, que é o Sem Abrigo.

Posso até nunca chegar lá, áquele lugar, ou Deus me chama antes, ou enquanto eu tiver sopro de vida, enquanto a minha mão pudér pegar na caneta, e a minha voz gritar, não pararei de dizer a pobres e ricos, a humildes e aristocrátas, a ignorantes e inteligentes, que o Sem Abrigo também é gente, gente que só sente gente, quando se escutam mutuamente no silencio da rua.

Lembrem-se que a simples ausencia do cheiro a detergente na roupa que vestimos, é um misto, de dor e saudade.

A RUA rouba-nos tudo...

Até os sonhos!!!

Daniel Horta Nova




2 comentários:

Anónimo disse...

Ola Daniel,

Muito sentido este texto, mas essencialmente verdadeiro :)
Os SEm Abrigo são gente como todos nos, a unica coisa que os diferencia e a falta de oportunidade que têm, mas ninguem ta livre de se tornar num.
O que eu puder fazer para ajudar farei.
Para ja com um simples chupa chupa :) vostento sacar um sorriso e dar um mimo, mas tento fazer mais do que isso, e contem com a minha assinatura :)

Beijos com muito carinho e amizade.
Querubina(CC)

MASA disse...

Obrigada Claudia, pelas tuas palavras.
Pois é muito mais importante um simples chupa chupa, quando é dado com carinho e um sorriso, do que qualquer outra coisa...
Um gesto sem nada, tão cheio de tudo!!!
O que a Rua nos dá de bom, é a oportunidade de conhecer gente linda como tu!
Obrigada!!!
Beijinhos
Daniel Horta Nova